quarta-feira, 2 de julho de 2025

Quando o Itamaraty age como comitê de campanha


A nota oficial do Itamaraty, repudiando uma reportagem da The Economist que qualificou o presidente Lula como "incoerente no exterior" e "impopular no Brasil", é um triste retrato de como a diplomacia brasileira foi degradada de instrumento de Estado a escudo partidário. O Itamaraty, tradicionalmente respeitado por sua sobriedade e profissionalismo, agora se presta ao papel de revisor de imprensa internacional, como se o prestígio da nação estivesse ameaçado por manchetes, e não pelas atitudes de seus governantes.

É preocupante que um órgão de Estado, sustentado pelos contribuintes e encarregado de zelar pelos interesses do Brasil no cenário global, se rebaixe ao papel de censor de veículos de comunicação e porta-voz da vaidade presidencial. Ao responder à crítica de uma revista estrangeira, seja ela o maior magazine do mundo ou um simples tablóide sensacionalista, o Itamaraty desrespeita sua própria tradição de compostura e confunde soberania com suscetibilidade. Países verdadeiramente soberanos não reagem a adjetivos; reagem a ameaças reais, não a análises políticas.

A frase “não temos que dar satisfação à imprensa” seria aceitável na boca de um líder autoritário. Mas é pequena, vazia e patética quando serve como norte para a diplomacia de uma nação democrática. Pior ainda: confirma a crítica da própria reportagem. Se Lula é de fato incoerente e impopular, não é por causa do The Economist, mas pelas posturas contraditórias no cenário internacional, como o flerte com ditaduras, o silêncio seletivo sobre violações de direitos humanos e a retórica arrogante que não se sustenta diante dos próprios fracassos internos.

Ao se incomodar com uma crítica, comum e corriqueira em democracias maduras, o governo brasileiro demonstra fraqueza, não firmeza; melindre, não altivez. E o Itamaraty, ao se prestar a esse papel, apequena-se como instituição. Não cabe à diplomacia proteger o ego de governantes, mas defender os interesses permanentes da República, mesmo que isso signifique suportar críticas justas e necessárias.

terça-feira, 24 de junho de 2025

O Umbigo Enterrado


O cabra pode até rodar o mundo todinho. Já andei no Shinkansen, o trem-bala de Tóquio para Yokohama no Japão, já me perdi nos becos do bairro de Alfama, em Lisboa, impressionei-me com as luzes da Times Square de Nova York, encantei-me com os cafés de Paris e com o cruzeiro de navio de Helsinque para Estocolmo. Apesar de ter morado quase sete anos nos Estados Unidos, nunca aprendi outros sotaques, outros modos, outros jeitos de dizer “bom dia”. Nunca esqueci a terra onde enterrei meu umbigo.

Essa história de enterrar o umbigo é mais que crendice de parteira. É pacto. Raiz invisível que a gente carrega no peito, feito cordão que nunca foi cortado de verdade. Quem nasceu em chão batido de terra quente, sabe: o mundo pode ser bonito, mas só um lugar tem o cheiro certo de quando éramos pequenos.

Eu conheço gente que virou doutor, político, autoridade, e mesmo assim volta todo mês de agosto pra renovar suas promessas com São Raimundo. Gente que, de terno e gravata, ainda sonha com o barulho da chuva caindo no telhado. Que carrega retrato amarelado no bolso ou na memória, da roda de conversa na pracinha da cidade, dos encontros debaixo da castanhola. 

Porque não adianta: o chão de origem não se apaga com carimbo no passaporte. E não é só saudade. É pertencimento. É saber de onde se veio pra não se perder por aí. É lembrar que, por mais que o mundo se abra, há um lugar que é só da gente, com seu silêncio particular, com suas vozes e músicas antigas ecoando dentro do peito.

E quando perguntam de onde a gente é, mesmo morando a léguas de distância, a resposta vem certeira, com um orgulho que quase treme na boca:

“Sou de Várzea Alegre, onde meu umbigo tá enterrado até hoje.”

quarta-feira, 18 de junho de 2025

"¿Por qué no te callas?"


A frase “¿Por qué no te callas?” ("Por que não te calas?") tornou-se mundialmente famosa após ser pronunciada pelo então Rei da Espanha, Juan Carlos I, durante a 17ª Cúpula Ibero-Americana, realizada em Santiago, Chile, no dia 10 de novembro de 2007.

O episódio ocorreu quando o rei se dirigiu ao então presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que, durante sua fala, interrompia insistentemente o primeiro-ministro da Espanha, José Luis Rodríguez Zapatero. Chávez, fiel ao seu estilo provocador, acusava repetidamente o ex-primeiro-ministro espanhol, José María Aznar, de ser um “fascista”, referindo-se a ele com termos ofensivos.

Zapatero, apesar de ser de partido oposto a Aznar, buscou manter o tom diplomático. Em sua fala, defendeu o ex-premiê, lembrando que, embora tivessem divergências profundas, Aznar havia sido eleito democraticamente e merecia respeito como ex-chefe de governo. Mesmo assim, Chávez seguia interrompendo, insistente e desrespeitoso. Foi nesse momento que o rei Juan Carlos, visivelmente irritado, perdeu a paciência e exclamou — fora do microfone, mas claramente captado pelas câmeras —: “¿Por qué no te callas?”

A frase correu o mundo. O que mais impressionou foi o fato de um monarca — tradicional símbolo de moderação e diplomacia — reagir com tanta veemência em público. Para muitos, aquela foi uma espécie de "freada simbólica" na verborragia de Hugo Chávez, frequentemente criticado por seu estilo autoritário, provocador e sua retórica agressiva.

O episódio também evidenciou o contraste entre os líderes populistas da esquerda latino-americana e os representantes das democracias liberais europeias, num embate que ia além do protocolo diplomático.

Anos depois, um momento curioso (e constrangedor) fez ecoar essa lembrança. Em 17 de junho, durante uma cúpula do G7 em Kananaskis, no Canadá — que reúne os sete países mais industrializados do mundo —, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, convidado ao encontro, protagonizou uma cena embaraçosa.

Logo no início da reunião, o primeiro-ministro do Canadá, Mark Carney, deu início aos trabalhos explicando que “nós vamos esperar um minuto pela tradução”. Pouco depois, perguntou: “Funcionou?” Lula, então, gritou: “Tem que falar aí!”, interrompendo o anfitrião. Carney, ainda paciente, perguntou: “Posso ir?”, querendo saber se podia começar seu discurso. Foi interrompido mais uma vez por Lula, que insistia: “Tem que falar aí, a intérprete tem que falar. Não está saindo (o som).” E ainda exigiu: “Manda falar qualquer coisa pra ver se o som sai aqui.” A cena causou risos de deboche entre os líderes mundiais presentes.

Naquele momento, cofiando a barba e tossindo discretamente (não, não "me engasguei comigo mesmo"), não pude evitar um pensamento irônico: se Sua Majestade estivesse presente, talvez tivesse sacado novamente a sua célebre exclamação — “¿Por qué no te callas?”

segunda-feira, 16 de junho de 2025

"Assim não se pode trabalhar!"


Durante o governo do presidente Ernesto Geisel (1974–1979), o Brasil enfrentava os efeitos colaterais de uma crise energética global e de uma inflação galopante que ameaçava a estabilidade econômica do país. Para tentar conter os danos e evitar medidas ainda mais drásticas, o então Ministro da Fazenda, Mário Henrique Simonsen, propôs uma solução criativa — e extremamente impopular: a criação do Certificado de Recolhimento Restituível (CRR), um tributo extra embutido no preço da gasolina, que passou a ser conhecido informalmente como "simoneta".

A alcunha era uma ironia amarga: uma alusão às “polonetas”, títulos públicos emitidos pelo governo da Polônia que o Brasil havia adquirido — e dos quais jamais conseguiu reaver o valor investido. A “simoneta”, portanto, carregava no nome não apenas o peso da medida fiscal, mas também o descrédito simbólico de experiências anteriores mal-sucedidas.

Coube ao senador Virgílio Távora, vice-líder do governo para assuntos econômicos no Senado, a ingrata missão de defender o novo imposto. Com sua habitual seriedade e competência, Virgílio preparou-se para justificar a medida em plenário: falou da crise internacional do petróleo, da necessidade de manter a economia girando, de conter a inflação e de evitar o temido racionamento de combustíveis. Seus argumentos, expostos com precisão na tribuna do Senado, buscavam enquadrar a “simoneta” como um remédio amargo, porém necessário.

No entanto, minutos após o discurso, a imprensa noticiava que o próprio presidente Geisel havia determinado o cancelamento da implementação do imposto, jogando por terra toda a fundamentação apresentada. Ao deixar o plenário e caminhar para seu gabinete, Virgílio teria desabafado com ironia contida e frustração sincera: "Assim não se pode trabalhar!"

E por que recordar esse episódio remoto, soterrado nas memórias do regime militar? Porque ele encontra eco em nossos dias. Ao assistir a recentes declarações do presidente Lula — especialmente aquelas que soam como “sincericídios” capazes de desautorizar toda a estratégia de comunicação governamental —, é possível imaginar Sidônio Palmeira, o atual ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), encarregado de reverter a curva de queda da popularidade do governo, repetindo em silêncio o lamento de Virgílio Távora: "Assim não se pode trabalhar!"

sexta-feira, 13 de junho de 2025

Não faz sentido falar em fuga


A acusação de que o Coronel Mauro Cid estaria planejando fugir do Brasil não se sustenta diante dos fatos. Desde que firmou seu acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal, Cid tem demonstrado plena disposição em colaborar com as investigações — inclusive entregando documentos, senhas, agendas e testemunhos que se tornaram peças-chave nos inquéritos em curso. Em troca dessa colaboração, ele obteve uma série de benefícios legais, todos nas previsões da legislação penal brasileira.

Entre os benefícios pactuados, estão o perdão judicial ou a aplicação de pena branda (inferior a dois anos), a restituição de bens lícitos, a inclusão no programa de proteção à testemunha, a liberdade provisória com uso de tornozeleira eletrônica, além da extensão de garantias legais a seus familiares. Em outras palavras, trata-se de alguém que está sob vigilância, com compromissos formais firmados com o Judiciário e cujos interesses dependem da continuidade de sua cooperação com o Estado. Nenhum desses elementos é compatível com o comportamento de alguém em fuga.

A solicitação e obtenção da cidadania portuguesa, por sua vez, não pode ser confundida com uma tentativa de evasão. O processo foi iniciado em janeiro de 2023, antes mesmo da formalização do acordo de delação, e foi fundamentado no fato de que sua esposa e suas filhas já possuem essa nacionalidade. O pedido seguiu os trâmites legais internacionais, sem subterfúgios ou ocultações. Receber um documento de identidade de outro país, ainda mais quando vinculado à família, não configura crime nem infração alguma — e está muito longe de ser prova de intenção de fuga.

Em resumo, a ideia de que Mauro Cid planeja fugir é incompatível com a realidade de sua condição legal. Ele tem mais a perder do que a ganhar com qualquer atitude que possa violar o acordo de delação, inclusive sua liberdade, sua carreira e os benefícios estendidos à própria família.

quarta-feira, 11 de junho de 2025

“Quer ser meu vice em 2026?”


Durante a oitiva dos réus da Ação Penal 2668, que trata dos eventos de 8 de janeiro e da suposta tentativa de golpe de Estado, o ex-presidente Jair Bolsonaro surpreendeu ao se dirigir ao ministro Alexandre de Moraes com a pergunta: “Quer ser meu vice em 2026?”. A frase, proferida em tom informal e inesperado, dividiu opiniões até mesmo entre seus seguidores — alguns criticaram a leveza diante da gravidade do processo; outros não compreenderam o real alcance da provocação. Contudo, no meu modesto modo de ver, o episódio está longe de ser um ato impensado ou inconsequente: ele carrega uma ironia estratégica e mensagens políticas claras.

Primeiro, a frase é uma crítica velada, mas mordaz, à falta de imparcialidade do ministro Alexandre de Moraes, que acumula as funções de julgador e parte interessada em diversas frentes que envolvem Bolsonaro e seus aliados. Ao convidá-lo para ser seu “vice”, o ex-presidente inverte os papéis e sugere que Moraes, na verdade, atua como opositor político, e não como magistrado isento. É uma acusação envolta em sarcasmo, mas extremamente grave: a de que o ministro, em vez de zelar pela legalidade, atua com viés ideológico, interferindo no jogo democrático com a toga.

Segundo, a frase reafirma — com todas as letras — que Bolsonaro não está fora do jogo político. Apesar de estar momentaneamente inelegível por decisão do TSE, o ex-presidente insinua que estará sim na disputa de 2026, direta ou indiretamente. O “convite” a Moraes, portanto, funciona como um recado duplo: ao tribunal, que não conseguiu calá-lo, e ao eleitorado, que ainda o vê como liderança de oposição viva e atuante. É a forma bolsonarista de dizer: “Ainda estou aqui, e continuo incomodando.”

É natural que o gesto tenha causado desconforto — afinal, trata-se de um julgamento. Mas ignorar a carga simbólica e política da fala seria um erro. Bolsonaro, com uma única frase, transformou a audiência em palco e lembrou aos seus adversários que quem provoca também domina narrativas. Resta saber se o Supremo saberá lidar com isso sem perder ainda mais a legitimidade diante da opinião pública.

sexta-feira, 23 de maio de 2025

Os capangas do Mato Grosso...


A Ação Penal 470, popularmente conhecida como "mensalão", foi o processo que julgou os envolvidos em um dos maiores escândalos de corrupção da história recente do Brasil. O caso girava em torno do pagamento mensal a deputados federais em troca de apoio em votações no Congresso Nacional. As sessões do Supremo Tribunal Federal foram todas televisionadas — e eu, confesso, tornei-me completamente viciado nelas. Não perdia uma sequer. Interrompia qualquer atividade para assistir, fascinado, às defesas muitas vezes surreais dos réus, que se esforçavam em vão para livrá-los de condenações mais que merecidas.

Na presidência da Corte estava o ministro Joaquim Barbosa, o primeiro negro a ocupar uma cadeira no plenário do STF. Indicado em 2003, Barbosa fez história. Polêmico, direto, fluente em quatro idiomas e doutor em Direito Público pela Universidade de Paris II, ele impôs um novo ritmo ao tribunal, ao mesmo tempo em que provocava admiração e controvérsias. Sua atuação no julgamento do mensalão foi marcada por firmeza, impaciência com o juridiquês e uma coragem incomum para afrontar colegas — inclusive os mais poderosos.

Um dos momentos mais memoráveis — e constrangedores — do julgamento foi sua troca de farpas com o ministro Gilmar Mendes. Em meio a uma discussão acalorada, Barbosa elevou o tom e disparou: "Vossa Excelência não está na rua, não. Vossa Excelência está na mídia, destruindo a credibilidade do Judiciário brasileiro. É isso. [...] Vossa Excelência, quando se dirige a mim, não está falando com os seus capangas do Mato Grosso, ministro Gilmar. O senhor respeite." A frase, até hoje lembrada, cristalizou não apenas o clima tenso do julgamento, mas também a personalidade explosiva e intransigente de Barbosa.

Lembrei-me desse episódio ao ver a recente notícia de que o ministro Gilmar Mendes teria reagido à possibilidade de sanções dos Estados Unidos contra o ministro Alexandre de Moraes. Ao ler, não resisti ao pensamento irônico: é melhor que o Presidente Donald Trump e o Secretário de Estado, Marco Antonio Rubio, tomem cuidado — vai que o ministro Gilmar resolve convocar os “capangas do Mato Grosso”…

Watergate: Escândalo que tentou esconder a verdade


O escândalo de Watergate não é lembrado apenas pela renúncia do presidente dos Estados Unidos (o único até hoje) — Richard Nixon — mas principalmente por ter escancarado ao mundo a capacidade de um governo de ocultar crimes, manipular instituições e mentir sistematicamente à população. O que começou como uma operação de espionagem política se transformou em um caso emblemático de encobrimento estatal deliberado, onde documentos foram suprimidos, gravações ocultadas e o próprio aparato do Estado foi mobilizado para calar a verdade.

Em 17 de junho de 1972, cinco homens foram presos ao invadir a sede do Comitê Nacional do Partido Democrata, no edifício Watergate, em Washington. A princípio, a Casa Branca negou qualquer envolvimento. Mas à medida que investigações avançavam — impulsionadas pelo trabalho investigativo de Bob Woodward e Carl Bernstein, do Washington Post —, tornou-se evidente que os invasores agiam a mando de membros da campanha à reeleição do presidente Richard Nixon, e que altos escalões do governo estavam dispostos a tudo para esconder esse fato.

O coração sombrio do escândalo não foi apenas o crime em si, mas a tentativa sistemática e coordenada de abafá-lo. O governo tentou desviar o FBI das investigações, utilizou a CIA de forma indevida para bloquear apurações, e pressionou órgãos estatais a não colaborar com a Justiça. Acima de tudo, houve a ocultação consciente de evidências: memorandos sumiram, versões foram forjadas e gravações cruciais — que documentavam conversas entre Nixon e seus assessores — foram mantidas em segredo por mais de um ano. Quando essas gravações foram finalmente reveladas, uma delas — a famosa fita de 23 de junho de 1972, o chamado “smoking gun” — mostrou Nixon ordenando que a CIA impedisse o FBI de continuar investigando.

Essa gravação provou que o presidente não apenas sabia da tentativa de acobertamento, mas comandava pessoalmente a sabotagem das investigações. A partir desse momento, não restavam dúvidas: o chefe do Poder Executivo havia usado o próprio governo como escudo para esconder a verdade e proteger seus aliados. O Congresso avançou com o processo de impeachment, e em 8 de agosto de 1974, Richard Nixon renunciou ao cargo, tentando evitar uma deposição ainda mais humilhante.

Watergate se tornou um marco global por revelar os perigos profundos da ocultação deliberada de informações pelo Estado. O caso demonstrou como um governo pode — quando não contido por instituições independentes e vigilância cidadã — transformar-se num sistema de mentiras oficiais, onde documentos desaparecem, provas são abafadas e a verdade é tratada como ameaça. Foi um lembrete duro e necessário de que a transparência é o único antídoto confiável contra o abuso de poder.

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Inteligência Artificial


Recebi do meu amigo Engº Adolfo de Marinho Pontes, uma instigante entrevista de Marcelo Tas com o cientista e professor Anderson Soares. O tema central: Inteligência Artificial. A conversa, lúcida e provocadora, despertou em mim o desejo quase urgente de escrever — registrar sentimentos contraditórios que emergem quando olho para trás, ao longo dos 76 anos do exercício intenso do viver.

Sou, antes de tudo, um bem-aventurado. Desde muito jovem as oportunidades me sorriram o que me fez alimentar uma imagem de robusta autoestima. Nas escolas que frequentei, nos concursos que enfrentei, tive a felicidade de sempre estar entre os primeiros e isso de certa forma consolidou essa certeza: eu era "o fodinha". Até que encontrei a Escola de Engenharia, ou melhor dizendo, até que a Escola de Engenharia me atropelou. Ali, mais do que ser engenheiro, aprendi a ter o mínimo de humildade. Encontrei colegas de mentes brilhantes "com capacidade cognitiva tão alta que não importa quanto me esforce, não vou conseguir atingi-los". 

Sinto-me um privilegiado por testemunhar uma era de transformações profundas. Iniciei minha trajetória profissional ainda nos primórdios da computação, quando as máquinas ocupavam salas inteiras e pareciam falar uma língua indecifrável. Domá-las era um desafio quase épico — uma arte entre técnica e instinto, como quem doma cavalos bravos. Fazer parte do seleto grupo de "geniosinhos" que operavam essas caixas enigmáticas foi, admito, combustível para cultivar meu pecado capital predileto: a vaidade.

Mas a velocidade assustadora com que a tecnologia avança e a preguiça mental (ou quem sabe a inaptidão crescente para aprender devido o avançar da idade), esmagam qualquer tentativa de acompanhamento. Agora, vejo-me a braços com essa desafiadora novidade chamada "Inteligência Artificial". Aonde vamos parar? Quais são os limites éticos e técnicos para a criação de IA generalista (AGI)? A IA pode substituir completamente profissões criativas, como arte, música e literatura? A IA pode criar uma nova forma de consciência ou inteligência não humana? Qual é o risco de uma "singularidade tecnológica" descontrolada? Essas são questões que me angustiam. Não apenas pela complexidade que carregam, mas pela sensação avassaladora de impotência que provocam.

Talvez seja esse o desfecho possível: a consciência de que, por mais que tenhamos domado máquinas, o futuro jamais será completamente domável.

terça-feira, 20 de maio de 2025

Se você precisa vomitar... leia!


"Se macumba ganhasse jogo, o Campeonato Baiano acabaria empatado"
João Saldanha, jornalista, comentarista e ex-técnico da seleção brasileira


Disputa bilionária mobiliza parentes de ministros do STF nas defesas

Familiares dos ministros atuam ou atuaram como advogados de um dos lados de processos que tramitam no STJ, na Justiça do Paraná e na Justiça Federal

Redação Jornal de Brasília
20/05/2025 6h03

GUILHERME SETO E JOSÉ MARQUES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

Uma disputa bilionária em diferentes tribunais entre gestores financeiros e Walter Faria, dono do Grupo Petrópolis, das cervejas Itaipava e Petra, mobilizou nos últimos anos pelo menos dez familiares de membros da cúpula do Judiciário brasileiro, que atuam como advogados nas causas.

Entre os que defendem ou defenderam algum dos lados do litígio estão parentes dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Kassio Nunes Marques.

Também participa do processo um filho do ministro Luis Felipe Salomão, vice-presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Os familiares dos ministros atuam ou atuaram como advogados de um dos lados de processos que tramitam no STJ, na Justiça do Paraná e na Justiça Federal em Brasília. A causa tem possibilidade de chegar ao Supremo.

Caso isso aconteça, pode causar uma enxurrada de impedimentos de ministros nas ações. O motivo é que, segundo a legislação, um magistrado não pode julgar uma causa na qual seu cônjuge ou parente tenha atuado.

Walter Faria e os empresários Renato Mazzucchelli e Ruy del Gaiso brigam desde 2019 pelo controle da Imcopa, empresa paranaense de produção de derivados de soja que está em recuperação judicial desde 2013. Os créditos da recuperação foram estimados em mais de R$ 3,3 bilhões.

O primeiro acusa os demais de terem dado “um golpe” durante sua prisão na Operação Lava Jato, em 2019. Ele foi investigado por suspeita de manter uma estrutura de pagamento de propinas e de agir em conluio com a Odebrecht. Em 2022, o ministro Gilmar Mendes anulou decisões tomadas em instâncias inferiores sobre o caso e determinou o arquivamento de ações penais.

Faria diz que tinha um acordo com Mazzucchelli, Gaiso e Naede de Almeida, seu ex-braço direito, de que eles investiriam recursos seus na Imcopa, para que ele não aparecesse publicamente como interessado. Segundo Faria, o combinado era o de que ele se tornaria o dono dos créditos da Imcopa, mas passou a ser impedido de exercer esse direito por meio de uma suposta alteração fraudulenta em contrato.

Os outros negam qualquer manobra e afirmam que Faria é quem tenta modificar termos acordados previamente. Mazzucchelli e Gaiso dizem que Faria concordou que a operação seria encabeçada por eles e abriu mão, em carta, de resgatar seu investimento antes do vencimento, estipulado para 2025.

A briga judicial tem diversos ramos. No STJ, discute-se a responsabilidade de cada tribunal para tomar decisões específicas a respeito do imbróglio e da recuperação judicial.

No ano passado, o ministro Antonio Carlos Ferreira derrubou determinações feitas no Paraná, por entender que invadiam a competência da Justiça Federal no DF. O caso ainda deverá ser levado a análise de colegiado no STJ.

Atualmente, a Imcopa é administrada pelo Grupo Petrópolis, que teve decisões favoráveis em Brasília e no Paraná.

Na disputa judicial, a família do ministro do STF Gilmar Mendes tem representantes nos dois lados envolvidos.

Em setembro do ano passado, Laura Schertel Ferreira Mendes, sua filha, foi incluída como uma das advogadas do Petrópolis no processo que tramita no STJ. Um mês depois, ela deixou o caso, e entraram Maria da Conceição Sabo Mendes e Pedro Anísio Sabo Mendes, filhos do juiz federal Italo Mendes, que foi presidente do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) e é primo do ministro do Supremo.

Maria Carolina Feitosa Tarelho, enteada de Gilmar Mendes e filha da advogada Guiomar Mendes, esposa do ministro, também fez parte da equipe de advogados do Petrópolis na disputa.

Do outro lado do processo estão as representantes da Crowned, empresa criada em Luxemburgo e que foi usada para receber recursos de Faria e investir em créditos da Imcopa.

Guiomar Mendes e sua filha Daniele, irmã de Maria Carolina (advogada da Petrópolis) e também enteada do ministro, foram contratadas para compor a equipe de advogados da Crowned. As duas trabalham para o escritório Sergio Bermudes. Valeska Zanin Martins, esposa de Cristiano Zanin, ministro do STF, também foi integrada ao grupo.

A Crowned, no entanto, também atravessa briga pelo controle. Na sexta-feira (16), um dos lados da disputa, o advogado Ricardo Bocchino Ferrari, solicitou a destituição de toda a equipe jurídica da empresa para que Tiago Limongi assuma o caso no STJ.

A R2C Holdings, de Mazzucchelli e del Gaiso, protocolou uma contestação em que afirma que Ferrari não é proprietário da Crowned e não tem poderes para substituir advogados. A peça é assinada por Guiomar, Daniele, Valeska e outros advogados.

Além dos já citados, o Grupo Petrópolis também tem como advogados no processo Karine Nunes Marques e Viviane Barci de Moraes, respectivamente irmã de Kassio Nunes Marques e esposa de Alexandre de Moraes, ministros do STF, como mostrou a coluna Painel, da Folha, e Luis Felipe Salomão Filho, filho de Luis Felipe Salomão, ministro do STJ.

Procurados, os ministros do STF e do STJ não quiseram se manifestar sobre o tema. Também procurados, não se pronunciaram Valeska Zanin Martins, Karine Nunes Marques, Viviane Barci de Moraes e Salomão Filho.

Guiomar Mendes afirma que, assim como em outras áreas, filhos de advogados muitas vezes buscam seguir carreiras jurídicas e que as relações familiares não influenciam nos desempenhos profissionais dos que trabalham no caso em questão.

Ela também diz que que não atuou ao mesmo tempo que Maria Carolina (advogada do Petrópolis) no litígio, pois a filha deixou o caso ainda em 2023. Por fim, afirma que continua a trabalhar no processo, independentemente da tentativa de destituição por parte de Ricardo Ferrari.

Pedro e Maria Sabo Mendes afirmam que atuam como advogados do Petrópolis desde antes do litígio com a Crowned (no caso dele, desde 2009; no dela, há mais de cinco anos) e que quando passaram a trabalhar nos processos do grupo não havia qualquer cruzamento familiar. Eles também afirmam que não existem possíveis interferências no exercício do trabalho.

Em nota, a R2C, de Mazzucchelli e del Gaiso, que constituíram a Crowned em Luxemburgo com o advogado Ricardo Ferrari, afirma que “levou em consideração o notável saber jurídico de todos os escritórios contratados, atuantes em processos de recuperação judicial e contencioso estratégico e envolvidos nas mais complexas demandas no Brasil e no exterior”.

Em nota, o Grupo Petrópolis diz que o processo que discute o controle da Imcopa em Brasília “já foi sentenciado pela Justiça Federal e todos os pedidos do Grupo Petrópolis contra Ruy del Gaiso e Renato Mazzucchelli foram julgados procedentes” e que Ferrari, “após tomar conhecimento dos crimes praticados pela dupla, trocou os advogados que representavam a companhia”.

“Logo, nos dias de hoje, a Crowned não é representada por nenhum advogado que seja parente de ministro do STF ou do STJ”, diz a nota.

“Todas as contratações [de advogados] foram feitas pelo Grupo Petrópolis levando-se em conta critérios exclusivamente técnicos. Nenhuma dessas contratações ocorreu após o litígio objeto da matéria, mas todas elas foram feitas em momento anterior”, diz a empresa.

segunda-feira, 19 de maio de 2025

Portugal Vira à Direita


A eleição legislativa de 18 de maio de 2025 representou uma guinada histórica no cenário político português. O Partido Socialista (PS), principal força da esquerda desde a Revolução dos Cravos de 1974, sofreu sua pior derrota eleitoral em décadas. Acostumado a ocupar o centro do poder — com mais de 41% do tempo à frente do governo em períodos majoritários e diversas participações em coalizões —, o PS viu-se superado por uma nova realidade política marcada pela ascensão da direita tradicional e o fortalecimento da direita alternativa.

O vencedor da disputa foi a coligação de centro-direita Alternativa Democrática (AD), liderada por Luís Montenegro, atual primeiro-ministro. Com 32,7% dos votos e 89 deputados eleitos, a AD consolidou-se como a força dominante no Parlamento, mas sem alcançar a maioria absoluta exigida para governar com estabilidade (116 assentos). Em paralelo, o fenômeno eleitoral mais surpreendente foi o desempenho do partido Chega, fundado apenas em 2019 por André Ventura, que conquistou 58 cadeiras — disputando voto a voto o segundo lugar com o PS e firmando-se como uma das peças-chave da nova correlação de forças.

Diversos fatores explicam o colapso do Partido Socialista: crises internas de liderança, escândalos de corrupção, perda de conexão com as bases populares, e o impacto de uma mudança no clima político global, que tem enfraquecido partidos de esquerda em diversos países. A eleição portuguesa de 2025, portanto, não foi um evento isolado, mas parte de um movimento mais amplo de reposicionamento do eleitorado europeu — hoje mais desconfiado das promessas ideológicas do passado e exigente quanto à eficácia política e econômica dos governos.

Diante do Parlamento fragmentado que emergiu das urnas, Luís Montenegro enfrenta agora o desafio de formar um governo estável. A possibilidade mais natural — do ponto de vista ideológico — seria uma aliança com o Chega, o que garantiria 147 assentos e maioria confortável. No entanto, a rejeição pública e reiterada da AD a qualquer acordo com Ventura torna essa solução praticamente inviável no curto prazo. A alternativa mais provável, embora frágil, é a tentativa de aproximação com o Iniciativa Liberal, partido que elegeu 8 deputados. Mesmo assim, a base somada ainda seria insuficiente para garantir maioria absoluta.

Uma coalizão entre a AD e o PS, que daria 147 cadeiras, resolveria o impasse numérico, mas é politicamente impensável dadas as profundas diferenças ideológicas e a rivalidade histórica que separa as duas legendas. Com isso, Portugal entra em um novo ciclo político: a esquerda enfraquecida, a direita em ascensão e um Parlamento sem maioria clara, onde o equilíbrio de poder dependerá da capacidade de diálogo, da renúncia a posturas radicais e, sobretudo, da maturidade das lideranças políticas diante de um eleitorado cada vez mais exigente e polarizado.

A eleição de 2025 marca não apenas a derrota de um partido, mas o fim de uma era de hegemonia ideológica. Resta saber se a nova direita portuguesa conseguirá transformar esse momento em estabilidade, crescimento e representatividade — ou se, como a esquerda, cairá no erro de se isolar de quem a colocou no poder: o povo.

terça-feira, 13 de maio de 2025

Janja causa constrangimento

"Durante um encontro entre o presidente chinês Xi Jinping e a delegação brasileira, a primeira-dama Rosângela da Silva, conhecida como Janja, teria solicitado a palavra para discutir os efeitos negativos da rede social TikTok, alegando que seu algoritmo favorece a disseminação de conteúdos de extrema direita no Brasil. Segundo relatos de integrantes da comitiva brasileira, o pedido de Janja foi inesperado e causou desconforto, já que não havia falas previstas no protocolo do encontro. A atitude foi considerada desrespeitosa por alguns participantes, incluindo a primeira-dama chinesa, Peng Liyuan. Apesar disso, o presidente Xi Jinping teria respondido que o Brasil tem legitimidade para regular ou até banir a plataforma, se assim desejar." (canaldopaulomathias)

terça-feira, 22 de abril de 2025

Quer entender o que é o comunismo? Venha a Praga. Fale com quem viveu.

Praça da Cidade Velha (Staroměstské náměstí) Praga,22/04/2025


Quem quiser fazer um verdadeiro exercício ideológico — sério, profundo e confrontador — deveria ir além dos livros didáticos enviesados e das narrativas prontas. A melhor maneira de entender o comunismo em sua essência não é através de teorias, mas de testemunhos. Venha a Praga, capital da República Tcheca. Esqueça os roteiros turísticos tradicionais por um instante. Converse com os moradores locais — jovens, adultos de meia-idade e, sobretudo, os idosos.

Pergunte sobre o comunismo. Não se limite a uma ou duas conversas: fale com dez, cem, quantas pessoas puder. Você ouvirá relatos reais, dolorosos e impactantes, de quem viveu sob um regime que prometia igualdade, mas entregou opressão.

Para tornar a experiência ainda mais rica, faça o Tour do Comunismo e visite o Museum of Communism in Prague. O acervo oferece um retrato cru e revelador do período entre 1948 e 1989, quando a antiga Tchecoslováquia foi transformada em um estado satélite da União Soviética. A exposição mostra como a ideologia comunista se infiltrou em todos os aspectos da vida cotidiana, da educação à cultura, da economia à espiritualidade.

Após o golpe de 1948, o Partido Comunista assumiu o controle total do país, eliminando as liberdades fundamentais. A imprensa passou a ser censurada, intelectuais perseguidos, e artistas silenciados. Um dos episódios mais simbólicos dessa repressão foi o julgamento e execução de Rudolf Slánský e outros acusados, em 1952, com base em falsas acusações de traição. Em 1968, a tentativa de abertura conhecida como Primavera de Praga foi esmagada brutalmente por tanques soviéticos, resultando em mortes de civis e no endurecimento da repressão nos anos seguintes.

A economia planificada, tida como o modelo ideal socialista, revelou-se um desastre. A Tchecoslováquia perdeu o bonde da revolução tecnológica e viu sua infraestrutura deteriorar-se enquanto a produção seguia metas absurdas e centralizadas. Os produtos eram obsoletos e de baixa qualidade, e até mesmo rodovias e pontes estavam em estado lamentável. O país, embora com dívida externa baixa, tornou-se completamente dependente da União Soviética, sofrendo diretamente os efeitos de crises como a queda das exportações de petróleo nos anos 80.

No campo internacional, a Tchecoslováquia ficou isolada. A recusa ao Plano Marshall e o alinhamento cego a Moscou colocaram o país à margem do progresso ocidental. Internamente, o regime tratou de infiltrar a ideologia comunista em todos os aspectos da vida. A religião foi reprimida, tradições locais sufocadas, e a cidadania, dissolvida. Muitas pessoas simplesmente se retiraram da vida pública, como forma de escapar do controle estatal.

Mesmo as manifestações culturais que conseguiam sobreviver, como o filme Closely Watched Trains ou o manifesto “Duas Mil Palavras”, de Ludvík Vaculík, eram constantemente reprimidas. E enquanto o regime falava em igualdade, uma elite comunista desfrutava de privilégios negados ao povo. A realidade era uma sociedade marcada por escassez, filas, vigilância constante e medo.

Mesmo com a Revolução de Veludo, em 1989, que trouxe de volta a democracia, as cicatrizes deixadas por quatro décadas de totalitarismo ainda são visíveis. Elas se expressam não apenas na arquitetura e na economia, mas no imaginário de um povo que aprendeu a desconfiar, a silenciar, a sobreviver à sombra de um Estado opressor.

Por isso, se quiser entender o que foi — e o que realmente significa — o comunismo, venha a Praga. Mas venha com os ouvidos e o coração abertos. Escute os que viveram. Aprenda com a dor alheia. E, ao voltar, reflita profundamente sobre os caminhos que estamos dispostos a trilhar como nação. Nem toda promessa de justiça é justa. Nem toda utopia leva à liberdade.

segunda-feira, 21 de abril de 2025

O Câncer Ideológico e Moral


Vivemos uma era em que os valores fundamentais da sociedade – como o mérito, a liberdade individual, o respeito à propriedade e à ordem – estão sendo corroídos por uma ideologia degenerada que se mascara de justiça social. A esquerda brasileira, com sua retórica populista e sua prática autoritária, representa hoje o verdadeiro câncer ideológico e moral da nossa era.

Essa doença não surgiu ontem. Vem sendo cultivada há décadas em universidades, sindicatos, ONGs e aparelhos de Estado – todos infiltrados por uma elite intelectual que despreza o povo real e idolatra teorias fracassadas, importadas de regimes totalitários. Essa elite vive de narrativas que invertem a realidade: o criminoso vira vítima, o trabalhador é explorado por existir, o empresário é inimigo, e o Estado é o grande salvador.

Lula da Silva, líder máximo dessa esquerda, não é a causa, mas sim a metástase. Sua trajetória é o espelho da degradação institucional e moral que tomou conta do país. Condenado por corrupção, solto por artifícios jurídicos, e alçado novamente ao poder com o apoio de uma imprensa cúmplice e de um Judiciário politizado, Lula encarna o triunfo da impunidade e da manipulação emocional em nome dos “pobres”.

Sua “entourage” – formada por políticos fisiológicos, intelectuais militantes e celebridades deslumbradas – age como parasitas do Estado, drenando recursos públicos para perpetuar sua influência, enquanto o povo comum continua refém da insegurança, da inflação, da baixa qualidade dos serviços e da ausência de oportunidades reais.

Esse câncer ideológico se espalha com o discurso do “nós contra eles”, instigando o ódio de classes, normalizando o ataque à liberdade de expressão e à liberdade econômica, e estimulando a dependência estatal como única forma de sobrevivência. O objetivo é claro: enfraquecer o cidadão para fortalecer o controle do governo.

É preciso, mais do que nunca, despertar a consciência nacional. Reagir a essa doença exige coragem, lucidez e compromisso com os valores que realmente edificam uma nação: trabalho, responsabilidade, família, fé, liberdade. O Brasil saudável, produtivo e honesto existe – e precisa retomar as rédeas antes que a metástase seja irreversível.

domingo, 20 de abril de 2025

A Nota Oficial do STF


Nos últimos 60 dias, importantes veículos de comunicação internacionais têm intensificado suas críticas ao Ministro Alexandre de Moraes e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Dentre essas manifestações, destaca-se uma série de matérias publicadas pela revista The Economist, que concentram foco nas decisões monocráticas do referido ministro, consideradas heterodoxas por analistas jurídicos e políticos.

Em reação a essa crescente onda de críticas, o Presidente do STF, Ministro Luís Roberto Barroso, em ato incomum, publicou nota oficial de apoio ao Ministro Alexandre de Moraes. A referida nota, publicada no site oficial do STF e assinada por seu presidente, levanta questionamentos sob diversas perspectivas.

Dentre os pontos problemáticos, encontra-se a negativa do presidente do STF em relação à declaração "nós vencemos o bolsonarismo", proferida em reunião da União Nacional dos Estudantes (UNE). Embora a nota negue tal afirmação, há registro em vídeo amplamente divulgado confirmando as palavras do ministro. A repercussão negativa foi tamanha que, posteriormente, o próprio Ministro Barroso tentou contextualizar ou esclarecer suas declarações.

Contudo, sob a ótica de um cidadão comum, ainda que sem formação jurídica, mas atento às práticas democráticas e às garantias processuais, o ponto mais preocupante da nota reside em seu conteúdo material e nos efeitos sobre a imparcialidade institucional do STF.

Existe atualmente um processo em andamento, sob relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, cuja fase processual encontra-se, ao que tudo indica, na análise da denúncia oferecida pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que acusa um grupo de indivíduos de envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado. Tal processo será julgado por uma das turmas do STF.

Nesse contexto, causa estranheza que o órgão que julgará o processo tenha emitido nota oficial, assinada por seu presidente, com declarações que indicam juízo de valor antecipado. No primeiro parágrafo da nota, afirma-se haver uma "alegada tentativa de golpe, com plano de assassinato do presidente, do vice-presidente e de um ministro do tribunal". No último parágrafo, a nota encerra com a expressão de que o enfoque dado pela imprensa “corresponde mais à narrativa dos que tentaram o golpe de Estado".

Essa construção discursiva suscita dúvidas jurídicas fundamentais: se o STF, por meio de documento oficial, declara que há uma "narrativa dos que tentaram o golpe de Estado", não estaria a Corte, antes mesmo da instrução probatória, antecipando um juízo de mérito? Em termos práticos, tal assertiva não comprometeria o princípio da imparcialidade e da presunção de inocência dos acusados?

Diante disso, duas conclusões se colocam, ainda que de forma provocativa: ou se aceita que já houve, de fato, uma forma velada de sentença antecipada, tornando desnecessárias as etapas processuais subsequentes e restando apenas aplicar a pena; ou se admite que o STF, ao emitir tal declaração pública, comprometeu sua própria autoridade como instância julgadora imparcial nesse caso específico.

Cabe aos juristas, operadores do direito e à própria sociedade civil refletirem sobre os limites da comunicação institucional de um tribunal e os impactos que tais manifestações podem gerar sobre o devido processo legal e a credibilidade da Justiça.

quarta-feira, 16 de abril de 2025

De Várzea Alegre a Viena


Datando de cinco séculos antes de Cristo, a região onde hoje floresce Viena integrava a rota do imponente Rio Danúbio. No entanto, foi apenas no século VIII da nossa era que passou a ser oficialmente chamada assim. Atualmente, Viena abriga cerca de dois milhões de habitantes, com um setor de serviços robusto e um expressivo polo industrial.

Cheguei ao hotel após uma noite inesquecível: um concerto de clássicos como Mozart, Bach e Vivaldi na Saint Peter's Catholic Church, uma igreja barroca construída no início dos anos 1700. Confesso que não fui educado a admirar música erudita. Ainda assim, não sei se pela majestade do local ou pela beleza intocável das melodias, senti-me profundamente emocionado — tanto quanto me emocionava, na juventude, ouvindo os boleros extraídos do acordeon de Chico de Amadeu e as baladas românticas no saxofone do inesquecível Mestre Chagas.

Durante o concerto, reparei que a igreja mantinha a tradição de cobrir as imagens dos santos com tecidos roxos quando da Semana Santa. Isso me transportou diretamente à minha infância, à igreja matriz de São Raimundo Nonato, em Várzea Alegre. Não sei se lá ainda se cultiva essa bela tradição católica, mas a lembrança ficou muito viva.

Descobri, ao longo do dia, que Viena não compartilha com minha terra apenas a inicial do nome ou a fé católica de seus habitantes. Há algo mais profundo. A Ringstrasse, sua principal avenida, abriga a Prefeitura (Rathaus), a Universidade de Viena, o Parlamento Austríaco e o famoso Burgtheater. Curiosamente, em Várzea Alegre, a então Rua Major Joaquim Alves (hoje Deputado Otacílio Correia), onde eu nasci, também concentrava símbolos de vida cívica e cultural: a Prefeitura Municipal, o Educandário Santa Inês de dona Eliza Gomes Correia, o Cine Odeon e, até há pouco tempo, a Câmara Municipal — nosso Parlamento varzealegrense, plantado diante da Praça dos Motoristas.

Outro elo invisível une as duas cidades. Viena possui o lago Alte Donau (Velho Danúbio), muito querido pelos vienenses. Embora não seja natural — é um antigo braço do Rio Danúbio — suas águas são límpidas, ideais para nadar, remar, velejar ou simplesmente andar de pedalinho. Várzea Alegre, por sua vez, tem a Lagoa de São Raimundo. Ainda que parcialmente aterrada para dar lugar a um moderno polo de lazer, no inverno, acredito que ela ainda ressurge, como nos tempos da minha infância. Talvez não tão limpa, talvez ainda sem pedalinhos — mas é nossa lagoa, espelho das nossas lembranças, enlevo da meninice.

Enfim, se você ainda não conhece nenhuma das duas, recomendo: conheça ambas. Mas vá primeiro à Várzea Alegre — porque é mais alegre e mais próxima. Depois, então, venha a Viena. Ela o receberá com violinos e muita história.

sexta-feira, 11 de abril de 2025