quarta-feira, 11 de junho de 2025

“Quer ser meu vice em 2026?”


Durante a oitiva dos réus da Ação Penal 2668, que trata dos eventos de 8 de janeiro e da suposta tentativa de golpe de Estado, o ex-presidente Jair Bolsonaro surpreendeu ao se dirigir ao ministro Alexandre de Moraes com a pergunta: “Quer ser meu vice em 2026?”. A frase, proferida em tom informal e inesperado, dividiu opiniões até mesmo entre seus seguidores — alguns criticaram a leveza diante da gravidade do processo; outros não compreenderam o real alcance da provocação. Contudo, no meu modesto modo de ver, o episódio está longe de ser um ato impensado ou inconsequente: ele carrega uma ironia estratégica e mensagens políticas claras.

Primeiro, a frase é uma crítica velada, mas mordaz, à falta de imparcialidade do ministro Alexandre de Moraes, que acumula as funções de julgador e parte interessada em diversas frentes que envolvem Bolsonaro e seus aliados. Ao convidá-lo para ser seu “vice”, o ex-presidente inverte os papéis e sugere que Moraes, na verdade, atua como opositor político, e não como magistrado isento. É uma acusação envolta em sarcasmo, mas extremamente grave: a de que o ministro, em vez de zelar pela legalidade, atua com viés ideológico, interferindo no jogo democrático com a toga.

Segundo, a frase reafirma — com todas as letras — que Bolsonaro não está fora do jogo político. Apesar de estar momentaneamente inelegível por decisão do TSE, o ex-presidente insinua que estará sim na disputa de 2026, direta ou indiretamente. O “convite” a Moraes, portanto, funciona como um recado duplo: ao tribunal, que não conseguiu calá-lo, e ao eleitorado, que ainda o vê como liderança de oposição viva e atuante. É a forma bolsonarista de dizer: “Ainda estou aqui, e continuo incomodando.”

É natural que o gesto tenha causado desconforto — afinal, trata-se de um julgamento. Mas ignorar a carga simbólica e política da fala seria um erro. Bolsonaro, com uma única frase, transformou a audiência em palco e lembrou aos seus adversários que quem provoca também domina narrativas. Resta saber se o Supremo saberá lidar com isso sem perder ainda mais a legitimidade diante da opinião pública.

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