quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

A batalha ideológica nas Universidades americanas



"Enquanto exista uma classe inferior, eu estou nela; enquanto houver um elemento criminoso, eu sou dele; enquanto houver uma alma na prisão, não sou livre" (Do socialista Eugene V. Debs em discurso de rua contra a participação dos Estados unidos na Primeira Guerra Mundial 1914-1918).

Em 5 de novembro de 2018, em artigo intitulado “Socialismo à americana”, escrevi:

“Sanders fez sua campanha defendendo saúde e educação gratuitas para todos, aumento (para o dobro) do salário-mínimo, diminuição da desigualdade interpessoal, maior controle sobre a função social das empresas, flexibilização da imigração etc. Uma pauta mais que liberal, com um viés claramente socialista, e diametralmente oposta à pauta conservadora de Trump. Quando o Senador Sanders perdeu a indicação, sua contendora e correligionária Hillary Clinton absorveu algumas das bandeiras (lembro-me bem de dobrar o salário-mínimo durante sua gestão e um movimento em direção às ideias imigratórias de Sanders, que já tinham sua simpatia), mas não foram suficientes para sensibilizar parte do jovem eleitorado de Sanders. Além da disputa das primárias ter sido muito renhida, ela representava a política tradicional com todos os seus defeitos e pecados.

Ouso dizer que nos próximos anos, no berço da democracia mais liberal do mundo, deverá nascer um forte Partido Socialista (talvez a recriação do Socialist Party of America, que cessou atividades na década de 70), ou quem sabe sejam eles os hegemônicos dentro do Partido Democrata.”


O movimento socialista americano data do Século XIX, com a chegada dos imigrantes marxistas alemães aos Estados Unidos após as revoluções de 1848 na Europa. O primeiro partido socialista americano foi o Socialist Labor Party (SLP. Partido Socialista do Trabalho da América) oficialmente fundado em 1876 em uma convenção em Newark, Nova Jersey. “O partido era constituído predominantemente por imigrantes alemães, que haviam trazido ideais marxistas para a América do Norte. A herança era tão forte que o idioma oficial do partido foi o alemão nos primeiros três anos.”

Naquele momento para fortalecer-se, o Partido Socialista formou fortes alianças com várias organizações trabalhistas por causa de seus objetivos semelhantes.

Na década de 30 nasce o movimento comunista ianque que durante a Segunda Guerra Mundial saltou de 20 mil para 7 milhões de membros no país, apesar da crescente divisão entre socialistas e comunistas.

Como registrado, movimentos de esquerda são antigos nos Estados Unidos. Na verdade, nunca foram tão expressivos quanto estão se tornando agora, seja pelo engajamento de jovens, mormente nas Universidades (“A Young America’s Foundation, principal entidade estudantil conservadora, analisou em 2017 pelo 25º ano seguido o perfil dos oradores convidados para as cerimônias de formatura. A conclusão é de que, para cada universidade com um orador de direita, 11 optaram por um esquerdista), seja pelo crescimento da ala dita progressista no Partido Democrata.

Nos últimos 365 dias, reitores de três das mais influentes e conceituadas Universidades americanas sentiram-se na obrigação de renunciar sob pressão. As causas são completamente diferentes, mas o cenário solidifica o entendimento de que a polarização política da sociedade tende a envolver o país em toda a sua plenitude (https://nilosergiobezerra.blogspot.com/ 2019/08/god-bless-america.html).

A presidente da Harvard University (provavelmente a mais conhecida e renomada Universidade do planeta), Claudine Gay, renunciou após alegações de plágio, um mês depois de prestar depoimento perante o Congresso, onde se recusou a declarar que pedir o genocídio dos judeus constituía assédio.

Evidente que as alegações de plágio de trabalho anterior não foi o principal motivo da demissão da Senhora Gay. Como apurado por um subcomitê da própria Corporação Harvard, houve “alguns casos de citação inadequada”, mas “nenhuma violação dos padrões de Harvard para má conduta em pesquisa”.

Esse caso específico envolve doações à Universidade (milionários judeus costumam ser generosos com as instituições universitárias) bem como pressões de ativistas conservadores contra a Presidente.

A demissão de Gay ocorre menos de um mês depois de Elizabeth Magill ter deixado o cargo de presidente da Universidade da Pensilvânia, tendo servido apenas um ano e meio. Tal como Gay, Magill pediu desculpa pelos seus comentários sobre a liberdade de expressão e o genocídio durante a audiência no Congresso do mês passado. Também a Senhora Magill esteve sob fogo cerrado de americanos que são defensores do povo judeu.

Ambas, Claudine Gay e Elizabeth Magill têm notória inclinação à esquerda, o que não se constitui surpresa tratando-se das Universidades americanas. Já o caso do terceiro demitido, Marc Tessier-Lavigne que renunciou ao cargo de presidente de Stanford depois que um inquérito da universidade descobriu que seu trabalho acadêmico anterior continha erros – ao mesmo tempo em que reconheceu que ele pessoalmente não havia cometido os erros e o inocentou de outras alegações. Alguns conservadores argumentaram que Tessier-Lavigne poderia ter sobrevivido se não tivesse irritado anteriormente os professores progressistas sobre a Covid, a liberdade de expressão e outras questões.

Se estivéssemos tratando de um jogo de futebol, eu diria que estava 2 a 1 para os conservadores, mas o assunto não é para se fazer gracejos. Esse cenário apenas estabelece quanto a sociedade da maior democracia do mundo está fragmentada, o que causa profunda preocupação na civilização ocidental. Teremos eleições presidenciais neste ano nos Estados Unidos e só Deus sabe o que pode acontecer.

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