sábado, 28 de maio de 2022

"Nós contra eles" ou Porquê não voto em Lula - Capítulo II




O ano de 2006 (ano da eleição) foi um ano muito "rico" em escândalos no Governo Federal. Além dos citados no Capítulo anterior, nem bem começara o ano, a Petrobrás comprou uma Refinaria em Pasadena, cidade localizada no sudeste do Texas nos Estados Unidos. A Empresa justificava: "esta operação de compra está alinhada com o plano estratégico da Petrobras que estabelece, entre seus objetivos, consolidar-se como uma empresa integrada de energia, com forte presença internacional, expandindo as atividades de refino e comercialização, no país e no exterior, em sintonia com o crescimento dos mercados". Na época, quem presidia o Conselho de Administração da estatal que deu aval à operação, era a ex-presidente da República Dilma Rousseff e o Presidente da Petrobrás era José Sérgio Gabrielli.

Mas o que há de inusitado nessa operação? Em 2006, a Petrobras pagou US$ 360 milhões por 50% da refinaria. O valor é muito superior ao pago um ano antes pela belga Astra Oil pela refinaria inteira: US$ 42,5 milhões. Enquanto isso, no seio da Petrobras, a refinaria era “carinhosamente” chamada de “ruivinha”, pois estava “enferrujada” (veja a foto) até o núcleo e precisava, urgentemente, de reparos. Pasadena era motivo de chacota desde o início. Dois anos depois, a Petrobras e sua sócia Astra Oil "se desentenderam" e uma decisão judicial obrigou a estatal brasileira a comprar a parte pertencente à empresa belga. A Refinaria de Pasadena, segundo o Valor Online, acabou custando US$ 1,249 bilhões ao Brasil (28 vezes o valor que a sócia comprara). Alguns anos depois, Pasadena foi negociada pela Petrobrás com a Chevron pelo preço de US$ 467 milhões.

Seguiram-se o Escândalo dos Sanguessugas, "também conhecido como máfia das ambulâncias, foi um escândalo de corrupção que estourou em 2006 devido à descoberta de uma quadrilha que tinha como objetivo desviar dinheiro público destinado à compra de ambulâncias"; O Escândalo dos Aloprados, ou escândalo do dossiê "foi uma tentativa de compra de um dossiê contra o candidato a governador de São Paulo, José Serra." A tentativa levou à prisão em flagrante, em 15 de setembro de 2006, de alguns integrantes do PT acusados de comprar um falso dossiê, de Luiz Antônio Trevisan Vedoin, com fundos de origem desconhecida"; e outros menos votados.

Para a eleição do segundo termo, a equipe de marketing de Lula esqueceu o "Lulinha paz e amor" e a "Esperança venceu o medo" para acertadamente radicalizar. Foi uma sacada inteligente, dado o desgaste do primeiro mandato, com o pipocar de escândalos e principalmente o não cumprimento de compromissos da campanha anterior. Com efeito, "a maior parte das promessas de sua contundente mensagem de mudança feita no Congresso, há quatro anos, não chegou a ser cumprida."

O Primeiro Emprego não se concretizou, atendendo apenas a 0,5% dos jovens que pretendia acolher. A promessa da criação de 10 milhões de empregos não chegou nem perto da metade do que se afirmou em campanha. Lula prometeu segurança pública mais eficiente e durante seu quatriênio os números de mortes violentas permaneceram iguais, chegando inclusive a aumentar em 2003 para 51534, de 49816 em 2002. A reforma agrária “pacífica, organizada e planejada” foi desclassificada por seus próprios apoiadores, a ponto de o líder do Movimento dos Sem-Terra (MST), João Pedro Stédile, pedir o fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário. “As reformas que a sociedade brasileira reclama” e que ele se comprometia a fazer, como as da Previdência, tributária, política e da legislação trabalhista, nunca tiveram o empenho do Governo.

Junte-se ao fiasco da realização das promessas na primeira campanha, aos escândalos descobertos e divulgados ao longo do primeiro termo, o caminho foi criar o "Nós contra eles". Em discurso festejando a vitória na Avenida Paulista, em São Paulo, o Presidente recém-reeleito disse que o resultado do 2º turno marcou a "vitória do andar de baixo contra o andar de cima".

Esperava-se que o Presidente Lula e seu Partido, no segundo mandato, tivessem um comportamento recatado, decente, decoroso, honesto. Afinal, o país (não a justiça) havia relevado todos os "malfeitos" do primeiro mandato, dando-lhes vitória nas urnas. A avaliação completamente equivocada dos principais partidos de oposição ("vamos deixar ele sangrar até a eleição") permitira a competente construção de uma narrativa de que Lula não sabia nada da corrupção em seu Governo, que eram as "elites" que queriam derrubá-lo e que ele era o defensor dos pobres ("nós contra eles"). Essa narrativa foi estimulada pela consolidação de programas sociais (alguns vindos do Governo de Fernando Henrique) e pelo cenário externo altamente favorável, mormente pelo boom das commodities.

De fato, no website oficial do FMI, colhe-se:

"No nosso mais recente relatório sobre as perspectivas econômicas regionais para a América Latina, mostramos que a taxa de pobreza caiu de cerca de 27% para 12%, e a desigualdade recuou quase 11% em toda a América Latina entre 2000 e 2014. Nesse período, comumente chamado de boom das commodities, os preços de produtos como o petróleo e os metais, subiram de forma constante graças à demanda crescente de economias emergentes como a China e a Índia." (Como o boom das commodities ajudou a reduzir a pobreza e a desigualdade na América Latina - Ravi Balakrishnan e Frederik Toscani).

Mas foi no segundo Governo Lula que a corrupção tornou-se uma metástase no organismo brasileiro. "A Operação Navalha deflagrada pela Polícia Federal no dia 17 de maio de 2007, visou desbaratar esquemas de corrupção relacionados à contratação de obras públicas feitas pelo governo federal. O esquema utilizado pela quadrilha consistia em superfaturar obras previstas no PAC"; O BNDES e Moçambique: "em Moçambique, a Odebrecht construiu o aeroporto (fantasma) de Nacala, financiado pelo BNDES. Moçambique devia ao Brasil 315 milhões de dólares que não conseguia pagar. Essa dívida foi integralmente perdoada por Lula da Silva em 2004"; O Governo Lula desviou R$ 111,4 bilhões da CPMF que eram da Saúde; O ecumenismo da corrupção: a construção das hidrelétricas do Rio Madeira (Jirau e Santo Antônio), obras que uniram na corrupção PT, PSDB, índios, ruralistas, CUT e Força Sindical. "Desde o processo licitatório das duas obras, iniciado em 2007 e 2008, respectivamente, se seguiu um turbilhão de repasses ilegais, caixa 2 e subornos que abasteceram lados antagônicos" (El País Brasil).

O ano de 2009 foi extremamente "profícuo" em relação à corrupção. A Refinaria Abreu e Lima (PE), seria construída por uma parceria entre a Petrobrás (Brasil) e PDVSA (Venezuela), acordada pelos então presidentes Lula da Silva e Hugo Chávez. A Venezuela não honrou o compromisso e a Petrobrás resolveu tocar o projeto sozinha. A refinaria que era para custar 12 bilhões de reais, saiu por mais de 100 bilhões, custando portanto 8.5 vezes a mais que o previsto para os cofres públicos. Consta de apuração do MPF que o contrato rendeu R$ 90 milhões em propinas a ex-executivos da Petrobras ligados ao PT, PP e PSB; O ex-ministro Antônio Palocci, que comandou a Fazenda e a Casa Civil em governos do PT, narrou em depoimento à Justiça Federal, em Brasília, uma reunião entre os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Nicolas Sarkozy, da França, em que teria sido negociado o pagamento de propina para a compra de helicópteros e a construção de submarinos nucleares pelo Brasil; Em 01/10/2015, a Revista Época estampa na sua capa chamada para reportagem na qual descreve a compra da Medida Provisória 471, que garantiu a manutenção de incentivos fiscais na ordem de R$ 1,3 bilhões ao ano. Essa MP teria rendido a deputados, senadores e pessoas ligadas ao então governo Lula, o valor de R$36 milhões.

O último ano da gestão Lula foi marcado pelo escândalo do Bancoop - empreiteiros que prestavam serviços a Bancoop teriam que emitir notas frias em favor da Banco por serviços não realizados e o dinheiro era entregue ao na época sindicalista João Vaccari Neto. O dinheiro desviado seria usado para fomentar o caixa dois da campanha de Lula em 2002; O escândalo dos Novos Aloprados, a quebra ilegal de sigilo fiscal de centenas de contribuintes brasileiros na Receita Federal, entre os quais dirigentes do PSDB e familiares do então candidato à presidência pela referida legenda, José Serra; O tráfego de influência da Ministra Chefe da Casa Civil, Erenice Guerra. Reportagem da revista Veja afirma que Erenice estaria envolvida em um suposto lobby para beneficiar empresários interessados em contrato com o governo federal. O esquema seria comandado por seu filho, Israel Guerra.

O grande escândalo do Governo Lula, aquele que foi considerado o maior processo de corrupção orgânica do Brasil em todos os tempos, só foi descoberto em 2014. Trata-se do que se convencionou chamar de Petrolão e objeto de apuração pela Operação Lava Jato, a maior operação contra a corrupção na história do país.

Mais sobre Petrolão e Lava Jato no Capítulo III.

quinta-feira, 26 de maio de 2022

"A Esperança venceu o Medo" ou Porquê não voto em Lula - Capítulo I




O segundo mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso enfrentou uma série de crises, crises internacionais e crise energética e uma crise cambial que desaguou em desemprego, aumento da dívida pública e queda na taxa de crescimento. Isso abriu espaço para a quarta tentativa do líder sindical, Lula da Silva, em busca do cargo de Presidente da República em 2002.

Com 61,27% dos votos válidos no segundo turno, Luiz Inácio Lula da Silva venceu o candidato do PSDB, José Serra, que conseguiu apenas 38,73% dos votos. O país celebrou sob uma grande festa e uma enorme esperança, a eleição de um operário migrante nordestino de origem muito pobre, em uma legenda partidária que havia sido criada sob o figurino da decência.

Em seu discurso de posse, calou profundamente na sociedade a afirmação de que “o combate à corrupção e a defesa da ética no trato da coisa pública serão objetivos centrais e permanentes do meu governo”. Era o Brasil em lua de mel com seu novo Presidente.

Em junho de 2005, Maurício Marinho, chefe do departamento de Contratação dos Correios, foi flagrado recebendo propina de três mil reais supostamente para o deputado federal Roberto Jefferson (PTB). Divulgado o vídeo, o Deputado Roberto Jefferson em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo em 6 de junho de 2005, afirmou que o Partido dos Trabalhadores (PT) pagou a vários deputados 30 mil reais por mês para votar a favor de legislação do interesse do governo. O escândalo consistiu nos repasses de fundos de empresas, que faziam doações ao Partido dos Trabalhadores (PT) para conquistar o apoio de políticos. O esquema de corrupção começou em 2003 e só em 2005 foi descoberto.

Estabelecida a crise no coração do governo, o Deputado Federal e todo poderoso Ministro da Casa Civil José Dirceu, acusado de chefiar a organização do esquema de propina, anunciou o seu pedido de demissão. Em entrevista coletiva com a imprensa, acompanhado de outros ministros, amigos e companheiros de trabalho, anunciou a volta ao cargo de deputado federal para atuar em defesa do governo e do PT. Era uma tentativa de debelar a crise que se aprofundava, especialmente no Congresso com ameaças de Impeachment do Presidente.

Após a delação de Maurício Marinho, sobre os detalhes do "Mensalão" que envolvia não apenas os Correios e o PTB, mas também o PT, o Presidente Lula convocou pronunciamento em rede nacional de TV (12/08/2005), afirmou que foi traído e pediu desculpas à nação; ""Quero dizer com toda franqueza que me sinto traído por práticas inaceitáveis, das quais nunca tive conhecimento. Estou indignado com as revelações que aparecem a cada dia e que chocam o país". Sua Excelência confirmava assim o escândalo do "Mensalão", gestado e operado no âmago do seu primeiro governo.

Naquele momento, provavelmente haveria condições favoráveis para um pedido de impeachment do Presidente. O PSDB e o DEM, partidos mais robustos de oposição, em estratégia depois constatada completamente equivocada, decidiram continuar denunciando os "malfeitos" do Governo Lula e do PT para fazê-lo "sangrar" até a eleição de 2006. Esqueceram da generosidade e ingenuidade do povo brasileiro, de que Lula é "um encantador de serpentes e mentiroso" (royalties para Ciro Gomes) e do poder da caneta do Executivo.

Apesar da cassação de José Dirceu pela Câmara e pelo desenrolar do que se convencionou chamar de "Escândalo do Mensalão" - Ação Penal 470 julgada no STF condenou 24 políticos, empresários, banqueiros etc (entre eles José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares e João Paulo Cunha), em entrevista ao Programa Roda Viva de 07 de novembro de 2005 (portanto pouco menos de um ano para a eleição de 2006), o Presidente Lula começou o processo de negação do "Mensalão" e de um sem número de denúncias que pairavam sobre ele e seu Governo.

Sobre o "Mensalão", afirmou: "Eu tenho certeza que não teve. Isso me cheira a folclore dentro do Congresso Nacional". Sobre Roberto Jefferson ter-lhe avisado e que ele teria chorado, disse não lembrar do choro mas confirmou a informação do Deputado e que ele teria mandado auxiliares seus apurarem e a denúncia não foi confirmada. Sobre José Dirceu: "Eu sou defensor dele porque não sei qual é a acusação contra o José Dirceu. A tese original era de dinheiro público nas contas do PT e até agora não tem comprovação. Não posso dar essas denúncias como verdade, porque estaria cometendo uma injustiça". Sobre o suposto financiamento de Cuba para sua campanha eleitoral em 2002: "Eu não posso acreditar que Cuba tenha passado dinheiro para campanhas eleitorais. Eu sei o 'miserê' que Cuba vive". Sobre o assassinato de Celso Daniel: "A Polícia Civil de São Paulo e a Polícia Federal deram o crime como caso comum. Eu acho engraçado que, toda vez que chega perto de ano eleitoral, tentam transformar a vítima em algoz". Sobre a afirmação de Duda Mendonça de que foi pago com dinheiro depositado em contas no exterior, Lula disse que o publicitário é que deve dar explicações. Quando perguntado sobre os recursos irregulares (caixa dois) usados na sua campanha, disse que o dinheiro irregular pode ter sido usado nas campanhas para prefeito, mas não na campanha para Presidente.

Pouco tempo depois do início da campanha de negação dos escândalos frequentes em seu Governo, em março de 2006, veio a público a denúncia de que seu superministro, Antônio Palocci, teria chefiado um esquema de corrupção na prefeitura de Ribeirão preto. "Palocci teria cobrado 'mesadas' de até R$ 50 mil mensais de empresas que prestavam serviços à prefeitura destinados aos cofres do PT, para financiar campanhas eleitorais e fraudar a democracia."

Como afirmei anteriormente, a generosidade e ingenuidade do povo brasileiro, apesar de tudo que está descrito neste texto, concedeu-lhe a oportunidade de redimir-se dos "malfeitos" do seu primeiro termo. Infelizmente, seu segundo mandato serviu para montar as bases do maior escândalo de corrupção de que se tem notícia em países ocidentais: o "Petrolão".

Fim do Capítulo I.

sábado, 21 de maio de 2022

Elon Musk no Brasil




Deve ter sido uma feliz (para Bolsonaro) coincidência e em política a criação de fatos positivos é extremamente importante. Ainda que Ulisses Guimarães tenha tido uma preferência especial pela expressão "sua excelência, o fato", nessa área a simbologia tem mais valor do que o fato em si. A verdade é que numa semana em que toda a mídia seria dedicada ao casamento do seu principal adversário, o Presidente Bolsonaro consegue ocupar não apenas as manchetes nacionais, mas citações positivas na grande maioria dos veículos de comunicação internacionais.

CNBC: "Elon Musk traveled to Brazil on Friday to discuss projects to protect the Amazon rainforest with President Jair Bolsonaro."
France24: "Billionaire Elon Musk arrived in Brazil Friday, announcing a project to bring internet access to schools in the Amazon and improve satellite monitoring of the rainforest."
Forbes: "Elon Musk made a surprise visit to Brazil on Friday to discuss Starlink connectivity with Brazilian President Jair Bolsonaro and other projects in the Amazon."
WashingtonPost: "Tesla and SpaceX chief executive officer Elon Musk met with Brazil’s President Jair Bolsonaro on Friday to discuss connectivity and other projects in the Amazon rainforest."
CBSNews: "Super excited to be in Brazil for launch of Starlink for 19,000 unconnected schools in rural areas & environmental monitoring of Amazon."
Bloomberg: "The world’s richest man was invited by the Brazilian government to discuss investment plans, implementation of new technology to monitor Amazon deforestation and a project to take broadband Internet to far-flung regions, including rural schools and indigenous communities."

Até agora o que se sabe dos frutos da visita do homem mais rico do mundo ao Brasil é que foram discutidas ações tais como conectividade com internet de alta velocidade em 19 mil escolas rurais e comunidades indígenas na Amazônia; a instalação de uma fábrica de carros elétricos da Tesla no país; o lançamento de foguetes da SpaceX em Alcântara, no Maranhão; investimentos em energia solar e eólica no Nordeste; todos assuntos muito importantes para o país, mas nada mais importante, e ponto central da viagem, do que a implementação de novas tecnologias para monitorar o desmatamento da Floresta Amazônica.

O desmatamento da floresta tem sido usado através de relatórios e estudos nem sempre baseados em dados confiáveis, gerados por universidades e ONGs no país e no exterior, para criminalizar o agronegócio brasileiro. O monitoramento da floresta por uma empresa privada internacional com credibilidade, terá o condão de definitivamente separar o que são notícias criadas para prejudicar politicamente o governo de plantão, aquelas forjadas pelos agronegócios de países concorrentes e as intervenções ilegais por queimadas e desmatamentos que exijam uma atuação firme e robusta, principalmente comprometendo a economia daquele que agrida a lei.

A verdade é que a visita do CEO da SpaceX é extremamente importante para o Brasil e deve ser festejada por todos, independente de trazer (e trará) dividendos políticos para o Presidente candidato á reeleição, em um momento em que é flagrante sua recuperação nas tão questionadas pesquisas de intenção de votos.

quinta-feira, 19 de maio de 2022

O cabo de guerra da apuração das eleições.




“Eu considero totalmente sem importância quem do partido votará, ou como; mas o que é extraordinariamente importante é isso: quem vai contar os votos, e como.” (Joseph Stalin - 1923).

Porque é um assunto que tem persistido ao longo do tempo insistentemente, discutido até em mesas de bar e porque é uma área em que já atuei profissionalmente com algum sucesso (https://nilosergiobezerra.blogspot.com/2020/11/um-dinossauro-da-computacao.html), arrisco-me a fazer uns poucos comentários despretensiosos sobre sistemas automáticos de apuração de eleições.

No Brasil no momento, o TSE há convidado profissionais e instituições para fazerem testes preventivos antifraude nas urnas eletrônicas que serão usadas na eleição de 2022. Foi criada a Comissão de Transparência das Eleições (CTE), destinada a “ampliar a transparência e a segurança de todas as etapas de preparação e realização das eleições”.

Colhido do website oficial do TSE:

"Por parte das instituições e órgãos públicos, compõem a CTE o senador Antonio Anastasia (PSD-MG); o ministro Benjamin Zymler, do Tribunal de Contas da União (TCU); o General Heber Garcia Portella, comandante de Defesa Cibernética, pelas Forças Armadas; a conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Luciana Diniz Nepomuceno; o perito criminal Paulo César Hermann Wanner, do Serviço de Perícias em Informática da Polícia Federal; e o vice procurador-geral eleitoral Paulo Gustavo Gonet Branco, pelo Ministério Público Eleitoral (MPE).
Os especialistas em Tecnologia da Informação e representantes da sociedade civil que também fazem parte da CTE são: André Luís de Medeiros Santos, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Bruno de Carvalho Albertini, professor da Universidade de São Paulo (USP); Roberto Alves Gallo Filho, doutor pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); Ana Carolina da Hora, pesquisadora do Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-DireitoRio); Ana Claudia Santano, coordenadora-geral da Transparência Eleitoral Brasil; e Fernanda Campagnucci, diretora-executiva da Open Knowledge Brasil."

Evidentemente é importante o teste nas urnas eletrônicas apesar de funcionarem "stand-alone". Como não estão ligadas à internet, argumentam, não podem ser "hackeadas". Mas devem ser testadas principalmente para garantir que o software ali hospedado vai executar a tarefa que se pretende: registrar com fidedignidade o voto do eleitor. A preocupação com a urna em si é importante mas não é o ponto mais vulnerável do sistema, a meu juízo. Existem outras etapas tão ou mais importantes do que essa.

Encerrada a votação, o presidente da seção usando uma senha pessoal, emite o Boletim de Urna (BU) que é o somatório dos dados coletados. Os BUs são tornados públicos e uma via segue então para a junta eleitoral responsável por aquela seção. Ali os dados são autenticados e transferidos ao respectivo Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Este os retransmite para o TSE através de uma rede exclusiva do sistema eleitoral. Isto torna menos vulnerável o sistema de transmissão. No sistema de transmissão do resultado da votação na urna, portanto, é menos provável que haja alguma tentativa de modificação dos desejos do eleitor.

“Esses dados só conseguem ser lidos nos equipamentos da Justiça Eleitoral que possuem as chaves para as diversas camadas de segurança, integrantes do sistema eletrônico de votação. Assim, depois de ser verificada na zona eleitoral, a autenticidade dos votos da urna eletrônica é checada mais uma vez no TSE, antes de serem incluídos na totalização”, informa o TSE.

A totalização centralizada é, sem dúvida, o elo mais vulnerável do sistema. Uma vez testado aleatoriamente um (estatisticamente) considerável número de urnas eletrônicas, checada a autenticidade dos BUs na junta eleitoral respectiva, utilizado um enlace privativo do TSE para a transmissão criptografada dos dados, resta assegurar-se que o software programado e hospedado no mainframe para a totalização esteja desenhado para cumprir o que determina a lei. Um qualificado profissional de TI, programador experiente e que tenha acesso ao sistema, certamente saberá como modificar os softwares mesmo durante o processo de apuração, para o benefício de algum candidato ou partido.

Isso já aconteceu de forma sistêmica? Não creio. É possível acontecer? Sim, é possível. Portanto, "seguro morreu de velho..."

domingo, 8 de maio de 2022

Stalin, o Papa e as Divisões Militares




Em 1935 era Presidente da França o engenheiro Albert François Lebrun. O Sr. Lebrun encarregou seu Ministro de Negócios Estrangeiros, Pierre Laval, para ir à Rússia tentar negociar com Joseph Stalin, o todo-poderoso Secretário Geral do Partido Comunista da Rússia Soviética, um pacto de não-agressão franco-soviética. A França já antevia o desejo expansionista de Hitler e temia uma agressão alemã ao seu território (o que de fato aconteceu em maio de 1940).

Na reunião, Stalin teria demonstrado interesse em saber qual a situação do exército francês, de que equipamentos militares dispunha, quantas Divisões possuía, etc. O Ministro Pierre Laval tentava convencer Stalin usando toda espécie de argumentos. Stalin era um perseguidor implacável de católicos no seu território, por isso era visto com muito maus olhos pelo Vaticano. O Papa Pio XII não perdia oportunidade para fazer restrições públicas ao dirigente russo. O Ministro Laval fez saber a Stalin que a assinatura do pacto certamente atrairia a boa vontade do Papa para com ele. Quando ele teria dito: “Ah, o Papa! Quantas divisões tem o Papa?”

Existem várias versões dessa alegada frase de Stalin. Uma outra versão divulgada em 1944 pela mídia americana é que numa conferência em Teerã, em dezembro de 1943, entre Joseph Stalin, Franklin Roosevelt e Winston Churchill, este último teria sugerido a possibilidade de o Papa estar associado a algumas das decisões tomadas. “O Papa", teria dito Stalin pensativo. "O Papa. Quantas divisões ele tem?".

Entre tantas versões existentes, existe uma em que o Presidente Roosevelt expressara a confiança de que a liberdade de culto seria restaurada na Rússia. Como parte desse desejo, em Teerã sugerira que o papa pudesse ser convidado para a conferência de paz, ao que Stalin teria respondido: “Com quantas divisões ele contribuirá para a vitória?”

Se a história é autêntica ou não e em que circunstância, é irrelevante. Serve para ilustrar as tendências da época em quase todo o mundo de que a espada é mais poderosa do que o pensamento. De que a democracia é uma concessão das armas e que os exércitos garantem diretamente não apenas segurança e prosperidade, mas também direitos humanos e liberdades.

Li ontem nos veículos de comunicação que o Ministro da Defesa do Brasil havia pedido uma audiência ao Ministro do STF Luiz Edson Fachin. Fachin está Presidente do Tribunal Superior Eleitoral e sob a alegativa de agenda lotada, não concedera a audiência e sequer marcara para uma data qualquer. Não entendi porquê, mas veio-me imediatamente à mente a suposta frase de Stalin.

Freud explica!

quinta-feira, 5 de maio de 2022

"Vai ser um ditadorzinho dos diabos!"




Era início de abril de 1986. Viajávamos, o Senador Virgílio Távora e eu para Lavras da Mangabeira em um Cessna Bimotor. A justificativa era uma palestra que Virgílio daria sobre a Constituinte que se instalaria em fevereiro de 1987, mas que já polarizava as atenções do país. Virgílio sempre havia sido membro preeminente do Senado e não surpreendia que ele fosse procurado diariamente por seus pares, lideranças diversas, imprensa etc, para comentar sobre o processo constituinte.

O assunto podia ser importante para a sociedade lavrense, mas eu não estava interessado no que diria o Senador. Eu era candidato a Deputado Estadual e tinha tido dificuldade de aproximar-me do Prefeito de Lavras, Chico Aristides. Era uma grande liderança na região e seu apoio significaria muito para mim. Não apenas pelos votos que ele conduziria no seu município, mas pela repercussão que causaria nos municípios vizinhos. Eu sabia da atenção e amizade que Chico nutria por Virgílio e liguei para o Senador. Expliquei-lhe que havia feito contacto com o Prefeito mas ele disse-me que ainda ia resolver em quem votar, que aquele município era extremamente conveniente para mim pela fronteira com Várzea Alegre, onde eu estava montando um expressivo grupo de apoio e que os votos de Lavras da Mangabeira provavelmente consolidariam uma presença forte do grupo virgilista que eu representaria naquela região.

Voltemos ao voo do Cessna. Virgílio pedira-me para marcar uma palestra dele em Lavras que ele falaria com o Prefeito. E estávamos então voando com esse objetivo: a palestra do Senador e como pano de fundo, não transparente para o resto da humanidade, a ajuda do líder político a um dos muitos que o procuravam para ter a sua benção. Durante o voo o Senador lia o Jornal "O Estado" que trazia notícias sobre a próxima campanha para Governador. O PMDB acabara de escolher seu candidato, o empresário Tasso Jereissati, por inspiração do então Governador Gonzaga Mota e apoiado pelo presidente do Partido, Mauro Benevides. Em determinado momento o Senador fecha o jornal e dirigindo-se a mim, afirma: "Nilo, se esse doutorzinho se eleger governador, vai ser um ditadorzinho dos diabos!".

O resultado da viagem e da eleição poderei elaborar em outro momento. Saltemos 35 anos no tempo. As candidaturas para Presidente estão (quase) postas. Mas como "o Brasil não é para amadores", os candidatos estão em campanha mas não podem dizer que são candidatos (são pré-candidatos) nem podem pedir votos (a não ser cantoras de sucesso da Bahia). Imaginemos o seguinte cenário: Lula perde a eleição para Bolsonaro ou desiste de sua candidatura e lança um poste qualquer (estou apostando em Boulos, Jaques Wagner, Haddad ou Gleise). Bolsonaro reelege-se Presidente e no seu vácuo elege-se Tarcísio em São Paulo, reelege-se Zema em Minas e mais uma dezena de Governadores alinhados com o bolsonarismo. Essa ecologia remete-me à frase premonitória do grande Virgílio Távora: "Nilo, esse doutorzinho vai ser um ditadorzinho dos diabos!"

segunda-feira, 2 de maio de 2022

Triste sina




Deus é brasileiro, reza o dito popular. Mas Esse conterrâneo parece ter abdicado de sua cidadania. Se não, está mostrando sua face apocalíptica, obrigando-nos a nos reconhecermos pecadores e aceitarmos o cenário atual como castigo pelos pecados cometidos.

Ainda que seja cedo para cravarmos como definitivo o quadro que se desenha, as campanhas presidenciais cada vez mais afunilam para termos o atual Presidente e o ex como disputando o privilégio de dirigir esta grande nação.

De um lado, a chapa centauro, figura da mitologia grega formada metade humana, metade animal. Ou mesmo a chapa lobisomem (lendas brasileiras), com corpo de homem e cabeça de lobo. Sim, porque inimaginável o ex-Governador Alckmin da Opus Dei, batendo palmas para o hino da Internacional Socialista ("Crime de rico a lei o encobre/ O Estado esmaga o oprimido/ Não há direitos para o pobre/Ao rico tudo é permitido…”). Aliás, ele e seu grupo político (?) sentem algum constrangimento pelo apoio do PSOL e PC do B? E estes entregam seus corações e mentes neste apoio?

De outro lado, a tentativa de reeleição do atual Presidente que se elegeu de forma brilhante, com muito pouco recurso de mídia e financeiro e as negativas de bandeiras de campanha ao longo do mandato. Uma rachadinha aqui, um depósito em conta corrente ali, mas nada nem de longe comparável aos escândalos da era PT (importante reler - https://nilosergiobezerra.blogspot.com/2019/09/nao-esperem-de-mim.html). O que decepciona é a amasia com o Centrão, a demissão de quadros da melhor qualidade como os Generais Otávio Rêgo Barros e Santos Cruz, além do fiador do combate à corrupção e ao crime organizado, Sérgio Moro, entre outras.

Alguns argumentam que Bolsonaro não teve sorte durante seu primeiro mandato: Brumadinho, óleo na costa brasileira, pandemia, guerra na Europa Oriental etc. Ora, brasileiras e brasileiros, se não podemos permitir sob nenhuma hipótese, o fantasma da volta da quadrilha que assaltou o país durante mais de uma década e meia, também não necessitamos de um dirigente azarado! O Brasil precisa de alguém com sorte, com muita sorte. E que Deus reassuma a sua cidadania.

Triste sina do nosso país.

P.S. Continuo sem acreditar que o ex-Presidente Lula manterá sua candidatura até a eleição.