domingo, 29 de novembro de 2020

"Brasileiro, profissão esperança"




O Governo Bolsonaro prenunciava-se no primeiro momento como um Governo que se pautaria pelo signo da decência, da correção, do decoro. E aqui usem-se os adjetivos "latu sensu". Não apenas na área de costumes, mas também no que diz respeito à transparência, à condução correta na economia etc.

A montagem dos Ministérios, afastada a tão indesejada influência política nefasta, consolidava a esperança de que "o Brasil agora vai!". Afinal estávamos saindo de um período em que a roubalheira grassou farta (por favor, não se enerve, pense apenas nos milhões de dólares devolvidos aos cofres públicos), do legado de degradação em setores da cultura (antes de xingar, lembre - para citar apenas um episódio - da peça teatral em que atores enfiam dedo em ânus de colegas), do maior desastre econômico acontecido na Terra de Santa Cruz (a maior recessão da história, a explosão do desemprego, a volta da inflação de dois dígitos etc).

Apesar da profunda divisão e esgarçamento no tecido social, o brasileiro em geral nutria o desejo de recomeço. O reencontro com seu destino de "país do futuro". Tínhamos profissionais altamente qualificados na equipe ministerial, especialmente em ministérios mais importantes. A presença de Sérgio Moro no Ministério da Justiça e Segurança Pública era a certeza do combate incansável à corrupção e ao crime organizado. O Ministro Paulo Guedes (o "posto ypiranga", lembram?) asseguraria a firme e adequada administração da economia. Eram duas das principais bandeiras consagradas nas urnas da eleição presidencial de 2018. Além de nomes que se revelaram durante a gestão como o Ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, o porta-voz da Presidência da República, General Otávio Santana do Rêgo Barros, a meu juízo um dos melhores quadros do Governo Bolsonaro. Alguns também indicam a Ministra da Agricultura no primeiro time. Longe de mim querer diminuir a competência de Sua Excelência, mas nomeie-me para esse cargo (eu que sequer sei diferenciar uma vagem de feijão de um cacho de arroz) que a agricultura continuará sendo a mola propulsora da economia brasileira.

Infelizmente, após 22 meses de Governo, parece que o casamento entre conservadores nos costumes e liberais na economia está terminando em divórcio. A sinalização é de um triste fim (a propósito, estou buscando para reler a obra do escritor pré-modernista Lima Barreto - "O triste fim de Policarpo Quaresma" - que eu li há mais de cinquenta anos. Se bem me lembro, há alguma semelhança com os dias atuais) registrando mais uma oportunidade perdida pelo país. Parte da equipe original foi exonerada ou forçada a pedir demissão. O respeitado Paulo Guedes não é mais tão "posto ypiranga" quanto antes. O Centrão passou a ocupar espaço respeitável no Governo. Concessões inadmissíveis foram feitas, diz a mídia, em nome da proteção a familiares e amigos. O Governo assiste impassível (analistas políticos até afirmam que o Governo colabora) ao estupro à Constituição com a "ameaça" de autorização à reeleição dos Presidentes das duas casas legislativas federais.

Eu não cometeria a insensatez de comparar o estelionato eleitoral do Governo Dilma com o atual. Guardadas as devidas proporções, no entanto, o atual tem causado muito mais frustrações. Promessas não honradas que abortam esperanças de uma nação inteira são um pecado imperdoável. 2022 está logo ali na curva. E um novo ciclo deverá iniciar-se, com novas esperanças. Empresto do premiado musical de 1997 dirigido por Bibi Ferreira, o título deste despretensioso texto, "Brasileiro, profissão esperança". Nada mais adequado.

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