quarta-feira, 3 de julho de 2024

A Burrinha Sabonete


Nos idos dos anos 50, cedo de uma manhã qualquer, o delegado da pequena cidade de Belaventura estava em sua casa tomando vagarosamente uma xícara de café. O delegado era um civil, membro de família tradicional da cidade e representante do Partido Político que estava no poder em nível estadual.

Aquele momento de paz foi rompido por batidas apressadas na porta. Sem sequer esperar um convite para entrar, seu compadre Zé Lotero, um homem suado e de expressão aflita, adentrou a sala. Ele estava visivelmente perturbado, os olhos arregalados e a respiração ofegante. Sem nenhuma formalidade, começou a falar:

— Cumpade, aquele nêgo rim dos Amaro roubou minha fia Fransquinha, sua afiada, onte de noite. Me dissero que tinham ido lá pro outro lado da serra. Cumpade, você acha que ele buliu em minha fia?

O delegado, um homem de meia-idade vestido com seu tradicional terno de linho branco, recostou-se na cadeira de balanço. Calmamente, tirou um cigarro do bolso do paletó, acendeu-o e deu uma longa tragada antes de responder.

— Cumpade, ele eu num sei não... — começou o delegado, soltando a fumaça devagar. — Mas um dia desses eu fui fazer uma diligência lá, e só na subida da serra eu comi minha burrinha Sabonete três vezes.

* Consta que a história é verdadeira e como a cidade e os personagens são conhecidos, resolvi escrever usando nomes fictícios para não ferir susceptibilidades.

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