
Em 9 de agosto de 1972, o Presidente americano Richard Nixon tornou-se o primeiro dirigente daquele país a renunciar, na esteira do que ficou conhecido como o Caso Watergate. Tudo aconteceu de forma muito rápida. "Em 18 de junho de 1972, o jornal Washington Post noticiava na primeira página o assalto do dia anterior à sede do Comitê Nacional Democrata, no Complexo Watergate, na capital dos Estados Unidos. Durante a campanha eleitoral, cinco pessoas foram detidas quando tentavam fotografar documentos e instalar aparelhos de escuta no escritório do Partido Democrata. Em 24 de julho de 1974, Nixon foi julgado pela Suprema Corte dos Estados Unidos e obrigado, por veredicto unânime, a apresentar as gravações originais, que comprovariam de forma inequívoca o seu envolvimento na ação criminosa contra a sede do Comitê Nacional Democrata e consequentemente a abertura de um processo de impeachment."
Em 1997, o Presidente Clinton estava sendo investigado pelo implacável Promotor Independente Kenneth Starr, acerca de negócios no seu estado de origem, o Arkansas, além da requisição de um seu assessor direto ao acesso a arquivos do FBI de centenas de pessoas sem autorização. Não eram questões para preocupar muito, até que explodiu o escândalo sexual Clinton/Monica Lewinsky. Esta jovem estagiária na Casa Branca teve um "relacionamento físico impróprio" com Clinton, nas palavras do próprio ex-Presidente. Para encurtar o relato, o Presidente Clinton foi acusado de perjúrio e obstrução de justiça, ao negar em depoimento no Senado o affair com a jovem estagiária, o que se comprovou verdadeiro posteriormente. Foi um período de muita turbulência na política americana, mas depois de 14 meses o Presidente Clinton foi livrado do processo de impeachment que houvera sido instalado pelo Senado daquele país.
O Presidente Trump passa atualmente por quatro investigações bem mais graves do que aquelas que afligiram os dois citados anteriormente. Qualquer uma, de per si, pode levar à tentativa de impedimento do Presidente. O impeachment é um processo longo, penoso e desgastante. Pressupõe não apenas uma razão jurídica objetiva, mas um massivo apoio popular. Enquanto as investigações seguem sobre a má utilização da Fundação Donald Trump, do conluio de sua equipe de campanha com o governo Russo, do desvio de dinheiro de doações de campanha para calar mulheres eventualmente assediadas pelo Presidente e pelo próprio assédio denunciado por várias mulheres, ele utiliza sem parcimônia as redes sociais (principalmente o twitter) para divulgar suas mensagens.
Há alguma semelhança, não muita, entre a vitória de Trump nos Estados Unidos e a eleição de Bolsonaro no Brasil. Aquele também posicionou sua campanha claramente nas vertentes econômica e de costumes (Make America Great Again). Usou largamente as redes sociais e dirigiu sua mensagem preferencialmente para um público conservador, classe média e contra a política tradicional e a grande mídia, público esse muito assemelhado ao alvo do Presidente eleito no Brasil. A grande diferença é que ao contrário da campanha no Brasil, a outra foi conduzida por uma equipe que dispunha dos melhores quadros e de inesgotáveis fontes de financiamento, a partir dos recursos do próprio candidato.
A sinalização do governo Bolsonaro para um alinhamento incondicional à política externa americana, levou-o a declarar que iria mudar a embaixada brasileira em Israel para a cidade de Jerusalem, movendo-a de Tel Aviv. Afinal, qual a importância disso? Uma eventual mudança da embaixada brasileira tem implicações políticas, uma vez que a maioria dos países do mundo rejeita a reivindicação de Israel de que Jerusalém é a sua capital. No momento, apenas os Estados Unidos e a Guatemala têm suas embaixadas em Jerusalem. Comercialmente é um desastre. Enquanto "em 2017, a balança comercial com os 22 países que formam a Liga Árabe teve superávit (exportações maiores que importações) de US$ 7,1 bilhões para o Brasil", a balança com Israel é deficitária em US$ 419 milhões.
O anúncio da intenção de mudar a embaixada antecipou um "entrevero pueril", para utilizar a feliz expressão do editorial da Folha de São Paulo. Aliás, se o Presidente eleito pretende espelhar-se no seu equivalente norte-americano, deve limitar-se a fazê-lo com relação à economia. Essa realmente vai bem. Pleno emprego (quase), sólido crescimento do PIB acima da média das três últimas décadas, cortes de impostos, a política de colocar os interesses dos "Estados Unidos em primeiro plano", a adoção de medidas para reduzir a burocracia e o incremento de investimentos em infraestrutura. No mais, muita cautela meu caro presidente Bolsonaro. Donald Trump é elefante em loja de louças no trato das questões de imigração, nas idas e vindas da política externa, no relacionamento com sua equipe de governo, no trato com o Congresso (inclusive com seus próprios correligionários), no cumprimento dos tratados internacionais (vide Acordo de Paris), na sua lida diária com a imprensa, etc.
Recorro à sempre aconselhável sabedoria popular, e neste caso ao provérbio português: “Prudência e canja de galinha não fazem mal a ninguém” ou sua versão brasileira, “Cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém”.